quinta-feira, 22 de abril de 2010

Escrito nas Estrelas: novela espírita


Desde que estreou, em 12 de abril, a nova novela das 6 tem atingido uma grande audiência e sendo bastante elogiada. Primeira trama de temática predominantemente espírita na emissora desde A Viagem, de 1994, Escrito nas Estrelas tem se mostrado bem ágil nas duas primeiras semanas, chegando a "matar" o mocinho logo no capítulo de abertura.

Escrita pela autora Elizabeth Jhin, o folhetim traz em primeiro plano a família do médico Ricardo Aguillar (Humberto Martins), que tenta se reerguer após o abalo de ter perdido Daniel (Jayme Matarazzo), seu filho único, em um acidente. O que ele não sabe é que o espírito do filho continua participando dos eventos da família, observando tudo o que acontece e às vezes até influenciando os encarnados a tomarem algumas decisões.

Pelo que pude perceber até agora, a novela não procura fazer o tipo "didática", ensinando termos complexos da doutrina espírita. Pelo contrário: está fazendo tudo de acordo com o tom de uma legítima novela das 6, forçando nos aspectos românticos e tornando a história o mais leve possível.

Com relação a este tratamento, não há nada do que se desculpar. Aliás, nas minhas aulas de literatura eu sempre faço uma comparação do gênero Romântico com as novelas das 6 da Globo. E se esse estilo faz tanto sucesso de público até os dias de hoje, é porque ele não pode ser ruim, não é mesmo?

O único problema que vejo em apresentar o Espiritismo de uma forma tão idealizada é que pode passar aos leigos uma imagem muito distorcida da doutrina. Por exemplo, no capítulo que foi ao ar dia 21/04, o personagem Daniel aprende que pode voar livremente por aí. A cena foi muito bonita, mas não levou nem dois minutos para surgir nas redes sociais da internet comentários como "Puxa, se depois da morte for assim, eu quero mais é morrer!". Sabemos que os espíritos podem volitar, sim, mas essa habilidade é adquirida por seus méritos, a custa de muito trabalho. Não é só querer e logo sair voando pela avenida Paulista.

Mas apesar desses voos da imaginação da autora, no geral o tom da novela não tem sido muito fora daquilo que estudamos na doutrina espírita. No capítulo do dia 22/04 os espíritos conversam sobre a necessidade de sintonia para se estabelecer contato com os encarnados, utilizando a comparação com um rádio. Puxa, eu sempre ouvi esse exemplo nos meus estudos sobre mediunidade!

O tema espírita é amplo, e felizmente Elizabeth Jhin demonstra ter conhecimento disso. É bem provável que a novela tome rumos bem inesperados, e que estes primeiros capítulos sejam apenas uma introdução ao que realmente vem por aí. Digo isso porque percebo que a história tem avançado em uma velocidade bem rápida, sem perder tempo em situações que não levam a nada e até abreviando cenas que um autor mais picareta exploraria mais. Por exemplo, em um minuto vemos dois personagens conversando sobre alguma coisa que eles precisam fazer, e depois corta para uma cena em que eles já fizeram aquilo. Isso não deixa aquela terrível sensação de que não acontece nada de realmente importante durante um capítulo, ou de que todo o suspense gerado sempre vai se revelar sem propósito.

Interessante também o jogo que é feito com os contos de fadas. Logo acontecerá um fato que lembra muito o baile da história da Cinderela, e já foram feitas referências diretas a esta personagem, inclusive a respeito do sapatinho de cristal.

Com relação ao elenco, acho que vale a pena ressaltar alguns pontos. Dos positivos nem há o que se falar: a atriz Nathalia Dill, que interpreta a batalhadora Viviane, faz um trabalho bem mais convincente aqui do que em sua novela anterior, Paraíso, quando pouco convencia na pele de uma menina rica e certinha. Humberto Martins está passando muito bem a tristeza de um pai que, só depois de perder o filho, percebe que poderia ter aproveitado melhor seu tempo — e também consegue transmitir o seu sincero desejo de redenção e renovação. Carol Castro tem mostrado que logo ganhará um papel de protagonista de novela das 8, encarnando uma Mariana tridimensional: simples, mas determinada; apaixonada, mas racional. E aquele que considero como um dos maiores atores do Brasil, Antônio Calloni, interpreta um personagem que os espíritas vão adorar e que vai fazer os ainda-não-espíritas olharem com muito mais interesse pela doutrina: o simpático Vicente é um apaixonado pelo Espiritismo e serve como um mentor, respondendo as maiores dúvidas dos não iniciados no assunto.

Como dá para perceber, elogiei o trabalho dos atores que interpretam os papéis dos "bonzinhos" da história. Mas como é uma novela das 6, por mais que os personagens busquem ser verossímeis e que seus inérpretes ressaltem o caráter humano de cada um deles, é impossível não haver os inevitáveis "vilões" da trama. E é aí que entram os pontos negativos da novela.

Até agora, os principais papéis de malvados cabem a quatro personagens: o truculento Gilmar (Alexandre Nero), a esnobe e interesseira Sofia (Zezé Polessa) e sua estúpida filha Beatriz (Débora Falabella) e a ciumenta Judite (Carolina Kasting).

De todos, até o momento Nero foi o único ator que conseguiu dar humanidade ao Gilmar, fazendo com que nos divertamos com seu jeito impaciente e puxa-saco, de modo que até torcemos para que ele mude e possa demonstrar seus outros atributos. Porém, a dupla de mãe e filha vivida por Polessa e Falabella parece ter sido criada somente com o intuito de ser objeto de ódio para o público. A mãe é petulante, grosseira, caprichosa e cínica, do tipo que reclama se vê a filha dos criados nadando na piscina em seu dia de folga e que estimula a própria filha a ter uma vida de luxo e facilidades. Já esta é apenas uma versão mais burra da própria mãe, não inspirando nem um pouco de simpatia e nem de graça, o que representa um total desperdício do talento de Débora Falabella.

O mesmo se aplica para Carolina Kasting, que até agora só fez cara feia para seu marido, o bondoso médico Dr. Guilherme (Marcelo Faria), e reclamando que não tem tempo para cuidar de si própria e que não quer que ele faça um trabalho voluntário aos sábados. Este ar maligno soa ainda mais anti-natural quando sabemos que a doce e forte Mariana está apaixonada pelo médico. Seria mais convincente se a autora da novela também apresentasse Judite como uma mulher que, apesar dos defeitos, também tem qualidades.

Mas, enfim: como eu escrevi lá no começo, Escrito nas Estrelas está só no começo e creio que ainda haverá muito tempo para desenvolver todos esses personagens e para responder várias questões que ainda nem foram comentadas. Por exemplo: por onde anda o pai de Viviane, e afinal por que ela ainda nem tentou encontrá-lo?

É cedo ainda, eu sei. Mas espero que o decorrer desta história seja tão cheio de emoção como foi A Viagem, que considero a melhor novela já prodizida pela rede Globo. Até o momento, Escrito nas Estrelas demonstrou ter gás o suficiente para chegar perto do que aquele trama conseguiu fazer nos anos 90.

Um comentário:

  1. Mas sabe que já conheci algumas "Beatriz" por aí? Pessoas que acreditam que o mundo gira em volta de seus umbigos, e que tudo está conspirando contra elas. Inventam histórias onde não há, só para provar que ninguém quer que o "plano" delas dê certo.
    Eu também estou gostando bastante dessa novela, e olha que não sou muito de TV... Eu já tinha começado a ler o Livro dos Espíritos antes da novela começar, e realmente tem muita coisa na novela que condiz com aquilo que está no Livro.
    Muito bom!
    Beijocas

    ResponderExcluir