domingo, 6 de dezembro de 2009

Carta a Pablo Villaça



Nos anos 90, quando eu era leitor assíduo da Set, escrevi um e-mail para a redação, elogiando o site que a revista havia inaugurado, mas reclamando da demora na atualização das notícias. Este e-mail foi publicado na edição seguinte, junto com o meu endereço eletrônico, e por algum tempo alguns leitores me escreveram, enviando principalmente propagandas relacionadas a cinema.


Uma dessas propagandas vinha de Pablo Villaça, um cara que se auto-proclamava crítico de cinema, e que havia fundado um site sobre o assunto: o Cinema em Cena. Fã da sétima arte desde a minha infância, fui logo dar uma olhada no trabalho do sujeito. Não achei nada de tão especial nas críticas, pois eu sempre considerara Rubens Edwald Filho o único verdadeiro entendido de cinema no Brasil e nunca achei que ele perderia seu posto. Mas volta e meia eu dava uma passadinha no tal Cinema em Cena.


Os anos foram passando, e fui notando significativas melhoras no site. Primeiro o visual ficou mais atrativo, depois o conteúdo. Até que, finalmente, me dei conta de que as críticas estavam ficando com uma qualidade boa demais, como eu nunca havia lido em qualquer outro espaço. Tudo isso eram sinais de que o Cinema em Cena estava evoluindo a passos largos, como uma criança depois que aprende a caminhar sozinha.


E foi quando eu já havia estabelecido o site como a minha principal fonte de informações sobre o meu assunto preferido que li uma das críticas mais emocionantes de todos os tempos. Não era sobre um filme, mas sobre o nascimento de Luca, o primeiro filho de Pablo. Muitas das minhas opiniões acerca de centenas de filmes haviam sido plantadas em mim através dele, mas foi aquele texto, tão apaixonado e pessoal, que me fez perceber definitivamente que aquele cara já fazia parte da minha vida, apesar de não conhecê-lo de perto.


Porém, como o orgulho que nos habita sempre acaba dando as caras se o alimentarmos, houve uma época em que passei a implicar com o Pablo. Às vezes porque eu não concordava com alguma crítica (as apenas duas estrelas para Inteligência Artificial e Gladiador foram difíceis de engolir, assim como todas as cinco de Batman Begins). E às vezes era por eu notar nele, sempre através dos seus textos, algumas más inclinações que eu mesmo tinha, mas que não queria assumir. Acho que esses defeitos que compartilhávamos era o próprio orgulho e aquela confiança irrestrita em si mesmo, que fazia com que nos achássemos os melhores do mundo. Por tudo isso eu até cheguei a escrever comentários maldosos no site, vez ou outra, como forma de vingança.


Mas assim como no roteiro de um filme, o protagonista sempre passa por um momento difícil, e precisa enfrentá-lo para tornar-se uma pessoa melhor. Sei que já passei por um desses pontos de virada no roteiro da minha vida, e noto que o Pablo também. E mais: percebo que muito do que eu melhorei, foi graças aos textos desse cara.


Lendo as críticas do Cinema em Cena aprendi a ter uma visão muito mais ampla sobre os mais diversos temas, como religião, preconceito, amor, política, morte, ecologia, esperança, violência, amor, guerra e mais uma porção de outros. Muito da minha cultura e da minha visão de mundo cristalizou-se depois de eu ter tido acesso a anos de leituras inteligentes e significativas sobre filmes, apesar de eu nem sempre concordar com as opiniões dele. Fazendo uma ligação com um livro recentemente lançado (o qual não li e não pretendo ler, graças aos comentários do Pablo) esse meu aprendizado foi um verdadeiro Clube do Filme, no qual utilizei apenas informações relacionadas ao cinema, e trazidas por alguém inteligente o suficiente para interpretá-las.


É claro que, até hoje, não sigo com fidelidade cega todas as dicas deste amigo. Ainda nesta semana fui surpreendido com quatro estrelas para uma produção que achei bem fraca. Mas a questão é que aprendi a conviver com essas diferenças de opinião, sem ficar gastando minha energia para mostrar que só eu estou certo e os outros errados. Amigo Pablo: sua participação nesta minha transformação para melhor foi de suma importância, e resolvi fazer este agradecimento porque, além de tudo, nunca paguei um centavo para beneficiar-me com seu trabalho.


Inclusive este e muitos outros agradecimentos que já fiz na minha vida foram motivados por você mesmo. Como esquecer aquele seu significativo post acerca do poder de um elogio, que você fez a um pobre garçom que te atendeu muito bem em um restaurante? E a mensagem sobre a educação dos curitibanos, de quando você ministrou um curso na capital do meu Estado? Ou ainda a sua indicação do cd da banda Anvil, mesmo sem gostar do estilo musical, simplesmente por ter se sensibilizado com a vida dos roqueiros ao assistir ao documentário The History of Anvil? Sem falar da vez em que você disse que compraria o DVD de Encarnação do Demônio, apesar de não gostar do filme, depois de ler a notícia de que o Zé do Caixão estava autografando DVDs piratas em São Paulo, para ajudar os camelôs.


Há muito de você na personalidade de milhares de seus leitores, e talvez haja mais do que se imagine. O simples fato de eu acreditar nos meus sonhos vem de várias críticas belíssimas que você já publicou. Vem também do fato de saber que você abandonou uma faculdade de Medicina para dedicar-se à grande paixão da sua vida, que é o cinema. Como não admirar alguém assim?


E é claro que isso não é tudo. Ainda nem falei das demonstrações de senso de humor nas resenhas dos piores filmes ou nas descrições de difíceis momentos de sua vida. Nem da forma maravilhosa como o vemos dedicar-se aos seus filhos. Nem da humildade que mantém com seus fãs, fazendo questão de conhecê-los pessoalmente quando estes o encontram em alguma sala de cinema. Nem da devoção que demonstra aos seus leitores e à sua família, que já te fez abandonar um alto cargo em uma empresa emergente do ramo cinematográfico.


É por tudo isso, Pablo, que minha avaliação para você é 5 estrelas em 5. Obrigado, amigo!


14 comentários:

  1. Gentileza a sua, Déa. Obrigado! Mas também, depois de anos lendo o Pablo, fica fácil, né?

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  2. Ooow, Luiz!
    Obrigado por concatenar fatos e percepções tão íntegros e coerentes acerca do nosso tão querido Pablo!
    Agradeço-te por ter, em vários trechos, traduzido opiniões que também tenho acerca do cara!
    Parabéns e, novamente, obrigado!
    ;-)

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  3. Puxa, muito obrigado pela demonstração de carinho, Marcelo. Grande abraço!

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  4. Belo texto.Sumarizou bem o que o Pablo representa para milhares de pessoas. Destaque para os posts do blog dele. É como pessoa que eu o mais admiro. Faço das suas palavras, as minhas. Parabens e obrigado.

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  5. Pablo é excelente, até mesmo quando não se concorda com ele. Parabéns pelo texto. ;-)

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  6. Parabéns pelo texto L.F. Riesemberg, belíssimas palavras. Confesso que sou um grande admirador de Pablo tb, eh uma pessoa fantástica. A primeira coisa que faço todos os dias ao acordar e a ultima antes de dormi é entrar em seu blog.

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  7. Fantástico. Li no Blog do Pablo sobre essa carta e fiz questão de acessar. Texto realmente maravilhoso, você simplesmente falou através da boca de várias pessoas que compactuam contigo essa mesma admiração pelo trabalho do cara. Abraço!

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  8. Parabéns pelo texto! Resumiu perfeitamente.
    Esse feito acaba de acrescentar mais uma seguidora ao seu blog!

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  9. Me identifiquei 99%, Luiz! (O 1% é por eu ter discordado pouco, muito pouco até hoje, das opiniões do professor...)! Belíssimo texto!

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  10. A humildade é uma das maiores virtudes de nós seres racionais! Parabéns pela bela carta! Não concordo com algumas críticas do Pablo, mas o admiro muito e aprendo um pouco mais sobre cinema.

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  11. Depois de, também, ter aprendido tanto com o Pablo, agora, nós leitores aprendemos um bocado com vc. Belíssima homenagem que concorda com muito do que todos nós leitores teríamos a dizer. Parabéns.
    Se quiser aproveitar e dar uma lida nos textos que escrevi, em grande medida tentando ser Pablo (a meu modo, e sem qualquer pretensão), passe lá:
    http://vivaitabira.com.br/viva-colunas/VerPerfil.php?IdColunista=8

    Abraço.

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  12. Eu dei uma olhada em seus textos, sim. Abraço!

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